segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Simulacro



Em onírica flor derramada está minha alma
Em glórias repousa, querendo fulgor e louros
É ela choros e torpor, lírica dotada de calma
É ela dotada de calma lírica, torpor e choros

Em alma derramada está minha onírica flor
Em fulgor repousa, querendo glórias e louros
É ela lírica de choros dotada, calma e torpor
É ela torpor e calma, lírica dotada de choros

Em alma onírica minha flor está derramada
Em louros repousa, querendo glórias e fulgor
É lírica ela de choros, calma e torpor dotada
É ela calma dotada de choros, lírica e torpor

Em flor alma está minha derramada onírica
Em querendo repousa louros, glórias e fulgor
É ela dotada de choros e torpor, calma lírica
É choros ela e lírica, calma dotada de torpor


Soares

para os professores Maria Cristina Ribas e Fernando Monteiro de Barros

sábado, 9 de julho de 2011

corde






ornamento de loucos
Tu és, oh amada
liberdade de poucos
Tu és em vanguarda


enrosco o meu pescoço ao teu
sem ajuda de carrascos vis
terás o meu sangue plebeu
vertido em tons carmesins


ornamento de poucos
Tu és, oh corda trançada
liberdade de loucos
Tu és em vanguarda


sem ajudo me caio
para a força da forca
minha carne, soslaio
pendular balança solta


ornamento de vanguarda
Tu és, oh deusa cruel
liberdade trançada
Tu és em castigo revel


cá estou com a gravata
que balança ao som das mortes
és, oh corda, da forca a bravata
que se estende em miríades sortes


ornamento de loucos
Tu és, oh amada
liberdade de poucos
Tu és em vanguarda



Soares


para Gustavo Abreu e Renato Rivello

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Réquiem




Eis o trôpego baço a flanar
pelas ruas de luas escuras
põe-se ébrio e tonto a dançar
chora em pingos a sua amargura


Para o corpo não hás de voltar?
Viverás em profanas agruras?
E se a morte vier a cobrar
faltas graves também obscuras?


Deixem ele que em triste acabar
solta leve as próprias ternuras.
Ermitão na cidade a cantar
canções vagas de muitas canduras


E da Torre que vai se lançar
vê Paris e as luzes seguras.
Sorve a torpe lufada de ar
e se joga em doces torturas


Soares


para Rozalvo Canella e Érika Klein

Fantasma




quero a arte e o prazer
o berro, o maldizer
a morte, entardecer
e sinéreses lamber


quero a boca arregaçada
revel e descarnada
sutil, escancarada
voraz e estuprada


quero Anjos nada Augustos
saciar-me em grandes bustos
em repastos e arbustos
apoplexo de sustos


os hiatos funéreos da contradição
que revelam e voam tal anú
deixam em sangue a conclusão:
ao escrever o poeta fica nu


então arte, boca, seio e prazer
anelam-se todos na vida esganiçada
em espíritos flácidos e robustos
em vielas sujas de borrão
em mim, nós e tu
em furor e dor e voz e fel
queime a louca letargia
traz-me o ócio menestrel


soares

tela: O Grito, Edvard Munch, 1893


terça-feira, 21 de junho de 2011

Geena






Eia Jezabel, transgrediremos nós no Inferno?
Não vês as almas em esparrelas aqui derramadas?
Transgressores não somos nesse vulcânico inverno
Somos meros, ralos, somados a doxas regaladas


Nem lésbicas, sodomitas, flâneur, dândi, Pandora
Não nos sobra em tempo a sutil originalidade
Resumiram-nos em figuras benditas d´outrora
Resumiram-nos em traços de redil anormalidade



Urge em nós a revelia
glória sórdida fugidia
clama fria a euforia
pecado herege um dia



Eia Jezabel, os sulcos das vinhetas estão sem viço!
Como hei de ver o Hermes do teu fabuloso busto
se a plebe possui reflexos de um nobre cortiço?
Escrínios vazios, brilhantes sem brilho por susto...



descarnados estamos do prazer
reduzidos a clangores internos
segredos inauditos estão a dizer
mataram os mistérios eternos



Eia Jezabel, minha alma sangra por falenas
que um dia vociferavam em cópulas amenas.
Hoje, barregãs floridas são escravas de novenas
em sufrágios, peanhas, comuns atos, cenas



Ah, amada Rainha de Baal
bebamos do negro castiçal
Se em nada podemos atiçar o mal
a arte Morre em anástrofe carnal



......................................................................
......................................................................



Eia Jezabel, os cães que te devoram nua
uivam a suculência de begônias malditas
são dignos de tua vítrea carne crua
em banquetes de esfumaçadas pecitas


Nem lésbicas, dândi, Pandora, flâneur, sodomitas
Não nos sobra em tempo a originalidade sutil
Resumiram-nos em figuras d´outrora benditas
Resumiram-nos em traços de anormalidade redil


soares



tela: Hercules and the Lernaean Hydra, Gustave Moreau,1876

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Estrela Alva




Eis que no rompante ele surge
e leva minh´alma à loucuras
eu me deixo cair, possuída
eu me deixo possuir, caída


Amado de Sínquises profanas
Eleito de dálias enegrecidas
Maldito de bênçãos levianas
Bendito de luzes enfraquecidas


Tu, rei, noivo, esposo, Deus
Eu, saliva, ruína, pó, desconstrução
Transporte-me para os aposentos teus
Transporte-me para a alva escuridão


A ti darei minha breve eternidade
Amo-te, farei o que lhe é mister
A ti darei o Parnaso, a deidade
Amo-te, príncipe, redentor, Lúcifer





soares




quarta-feira, 8 de junho de 2011

paixão de Cristo








pode haver algo mais herege que o amor?


torpor de dores, intervenção de cores,


pode haver algo mais herege que o amor?








a pedra do sepulcro removida


a mulher estatelada


a nas mãos não pedra mais erguida


a mulher estatelada








pode haver algo mais herege que o amor?


odor de prantos, risos e encantos,


pode haver algo mais herege que o amor?








o cântaro ao poço frente, vazio


a mulher enebriada


o que já não tinha odre vinho


a mulher enebriada


unguento o derramado ungindo


a mulher enebriada








pode haver algo mais herege que o amor?


como vos amou, tudo em si deixou,


pode haver algo mais herege que o amor?








o de sangue fluxo o e toque


a mulher saciada


o irmão ressurreto, morto ao evoque


a mulher saciada


corpo jovem, esquife no encoste


a mulher saciada








pode haver algo mais herege que o amor?


lânguido, cândido, fel, lúbrico, pudico, cruel


pode haver algo mais herege que o amor?







soares